O CIP apresentou ontem um relatório sobre a exploração da areia pesada de Moma, que mostra que a Kenmare nada paga ao Estado
O vice-ministro da Energia, Jaime Himed, assistiu mudo à apresentação do relatório e ao debate subsequente. Na hora da saída, o governante fintou a Imprensa
Maputo (Canalmoz) – O Centro de Integridade Pública (CIP) divulgou ontem mais um estudo de caso da indústria extractiva em Moçambique que expõe os parcos ganhos que o Estado obtém da actividade de exploração de área pesada de Moma, pela Kenmare.
De 2008 a 2011 a multinacional, que produz no País desde 2007, pagou ao Estado apenas 3.5 milhões de dólares norte-americanos, quando ela lucrou quase 60 milhões de dólares só em 2011.
E estes pagamentos não são provenientes de Imposto sobre Rendimento de Pessoas Colectivas (IRPC). Aqui a Kenmare tem isenções.
“90% dos pagamentos vêm do imposto sobre a produção, outros pagamentos marginais incluem um imposto de superfície e uma taxa de concessão”, concluiu o CIP.
Isenções que se confundem com subsídios
A Kenmare não paga ao Estado porque beneficia de muitas isenções.
A Kenmare Mining, a unidade que se dedica exclusivamente à mineração em Moma, apenas paga 3% de imposto de produção sobre os minerais vendidos (e não sobre o que produz); paga 17.5% de IRPC nos primeiros 10 anos; não paga impostos de importação, exportação nem IVA.
A Kenmare Processing, a unidade que se dedica em exclusivo ao processamento em Moma, opera sob estatuto de Zona Franca Industrial (ZFI), por isso não paga imposto de importação, exportação, IVA nem IRPC; a tributação da receita é limitada a 1% da receita depois de 6 anos.
Adriano Nuvunga, director do CIP que apresentou o estudo, disse que “estas isenções chegam a confundir-se com subsídios do Estado”.
Trabalhadores pagam mais imposto do que a empresa
Como consequência deste “mar de isenções”, os trabalhadores moçambicanos na Kenmare, quando somado o que pagam de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares (IRPS) é 2.5 superior à totalidade de imposto que a empresa paga. Na Kenmare trabalham cerca de 950 pessoas, das quais 85% são moçambicanos.
PME’s sacrificadas com impostos altos
Adriano Nuvunga questionou por que razão as Pequenas e Médias Empresas (PME) pagam mais impostos do que as multinacionais, questão que ficou sem resposta.
O director do CIP recomenda o Governo a ser mais transparentes, tornando os contratos públicos. Recomenda ainda capacitar seus quadros para monitorar as actividades das empresas que extraem os recursos minerais no País.
Kenmare registada no “paraíso fiscal”
O grupo Kenmare está todo ele registado em “paraísos fiscais”. A empresa Kenmare Moma Mining, que é a gestora da sucursal que opera em Nampula, não está registada em Moçambique. Está registada nas Maurícias, um conhecido “paraíso fiscal”. Segundo explicação do director do CIP, este registo foi por obrigação do Banco Africano de Desenvolvimento que, para conceder financiamento ao projecto, exigiu que tivesse registado em África. A Kenmare então escolheu registar-se não em Moçambique, mas, sim, nas Maurícias.
Em Jersey, outra ilha “paraíso fiscal” do Reino Unido. é onde está registada a empresa mãe da Kenmare. Para o director do CIP, este registo visa necessariamente facilitar evasões fiscais pelo que a empresa nem precisa das isenções que recebe do Governo.
O estudo foi apresentado e debatido por diversas personalidades, desde diplomatas/doadores, sociedade civil, autoridade tributária, deputados. O vice-ministro da Energia, Jaime Himed, esteve presente a representar o Governo. Foi notável o silêncio do vice-ministro durante o debate. À hora de saída, o governante fintou a Imprensa, evitando responder qualquer questão.