Um relatório de estudo da exploração do gás de Pande e Temane, na província de Inhambane, apresentado ontem pelo Centro da Integridade Pública (CIP) em Maputo, revela que Moçambique está a ser burlado neste que é o primeiro grande projecto da indústria extractiva a ser explorado em Moçambique.
“O gás natural é tido como sendo o futuro de Moçambique mas o primeiro projecto de gás – Pande Temane – não gerou, praticamente, nenhuma receita ao Estado moçambicano”, refere o relatório ontem apresentado em Maputo pelo director do CIP, Adriano Nuvunga.
“Preço de venda abusivo”
O estudo demonstra factualmente que Moçambique ganha nada neste negócio. O CIP foi buscar o preço pelo que o gás moçambicano é comercializado na África do Sul e comparou com o preço praticado em Moçambique.
Em 2009, a mesma quantidade de gás que a Sasol comprava a 1, 4 dólares em Moçambique, revendia na África do Sul por 7 dólares, refere o CIP e classifica esta situação de “preço de venda abusivo” do gás moçambicanos.
Como consequência, o projecto de exploração de gás de Pande e Temane apenas trouxe ao Estado moçambicano, desde 2004, 50 milhões de dólares em receitas, enquanto na África do Sul o valor anual do mesmo gás é de 800 milhões de dólares.
O CIP diz que esta situação é ainda mais preocupante porque o projecto já durou 1/3 do seu tempo de vida previsto, que é de 25 anos. Assim sobram poucas esperanças sobre a possibilidade de Moçambique vir a obter ganhos significativos com o gás de Pande e Temane.
Causas das perdas
Para tão desastroso negócio, o CIP encontra explicação em quatro factores principais: falha na partilha da produção; falha no preço de venda; falha nas projecções das receitas e; fracasso na transparência.
Explicando estes pontos, Nuvunga que apresentou o relatório, disse que as perdas de Moçambique aconteceram em 2000, quando o Governo removeu o “acordo de partilha de produção”, sem no entanto aumentar o imposto royality e as taxas do IRPC.
“O sector dos petróleos em Moçambique baseia-se num acordo de partilha de produção, onde a principal fonte de receitas do Estado provém de uma partilha cada vez mais maior do petróleo produzido”, lê-se no relatório do CIP.
Mas para o caso do gás de Pande e Temane, o Governo removeu o “acordo de partilha”, sem aumentar a actual percentagem do imposto royality (5%) e do Imposto sobre Rendimento de Pessoas Colectivas (IRPC) em 35%, o que lesou o Estado no negócio.
Como reverter a situação?
Para reverter este negócio em que o Estado moçambicano nada arrecada, o estudo do CIP propõe uma series de medidas. Na verdade, algumas propostas não é a primeira vez a serem recomendadas ao Governo, mas sempre foram rejeitadas ou pelo menos ignoradas.
“Renegociar os Contratos; Revisitar as Projecções de Receitas; Assegurar a Plena Transparência”, são as três recomendações do CIP.
Detalhadamente a organização aconselha o Governo a aumentar as taxas de Royalty e IRPC para compensar as perdas na partilha de produção; aconselha ainda a renegociação do preço de venda do gás em Moçambique, com base no valor de venda real do mesmo gás na África do Sul.
Não repetir os mesmos erros
No concernente às projecções de receitas provenientes deste projecto, o CIP fala de “surpreendentes estimativas exageradas por parte dos apoiantes do projecto (MIREM, FMI, Banco Mundial)” e exige destes explicação aos moçambicanos.
Recomenda ainda que se “assegure que os mesmos erros não estejam a ser cometidos para com o carvão mineral em Tete e o gás do Rovuma”.
Quanto à transparência, o CIP exige que “todos os dados de receitas” sejam “domínio público” e “todos os contratos do sector extractivo deverão sejam plenamente revelados”.