Um estudo realizado pelo Centro de Investigação em Saúde da Manhiça, na província de Maputo, revelou um preocupante aumento do número de casos de hipertensão entre mulheres não grávidas em idade reprodutiva em Moçambique.
A investigação, que envolveu 1.825 mulheres não grávidas e 6.770 gestantes, fez parte do Projecto PRECISE (PREgnancy Care Integrating Translational Science, Everywhere), abrangendo também Gâmbia e Quénia.
Os resultados demonstram que 10,4% das moçambicanas não grávidas em idade fértil apresentam hipertensão clinicamente confirmada, uma taxa significativamente superior à do Quénia, que é de 4,6%, e semelhante à Gâmbia, com 9,3%.
Outro dado alarmante aponta para a discrepância entre a realidade clínica e a percepção individual das mulheres. Apenas 4,2% destas relataram sofrer de hipertensão, enquanto 17% apresentaram pressão arterial elevada. Segundo a investigadora e líder do estudo no país, Esperança Sevene, “a maioria das mulheres com hipertensão não tem consciência do problema ou nunca recebeu um diagnóstico formal”.
Entre as mulheres grávidas, o cenário também é preocupante. Apenas 2,7% das gestantes moçambicanas relataram hipertensão, um número muito inferior ao observado clinicamente. Esperança Sevene sublinha a importância de medir a pressão arterial em todas as consultas de saúde materna, de forma a não perder oportunidades de diagnóstico e intervenção precoce.
Os dados do PRECISE indicam que a maioria das mulheres avaliadas vive em zonas rurais e está maioritariamente envolvida em actividades manuais, como a agricultura. Estes resultados revelam uma lacuna crítica: a dependência dos inquéritos de saúde de relatos pessoais pode não captar a verdadeira prevalência da hipertensão, podendo assim comprometer a eficácia das políticas de saúde pública.
Em Moçambique, como em muitos países africanos, a vigilância em saúde foi historicamente orientada para o combate de doenças infecciosas, como o HIV, a malária e a tuberculose. Contudo, as Doenças Não Transmissíveis (DNT), como hipertensão, diabetes e cancro, estão a emergir como um desafio significativo de saúde pública do século XXI.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda a abordagem STEPwise, que combina relatos pessoais com medições biomédicas padronizadas de pressão arterial. A adopção deste método seria uma forma de Moçambique alinhar-se com melhores práticas internacionais e identificar precocemente as mulheres em risco.
A equipe técnica do estudo defende a urgência em reforçar o rastreio da hipertensão nos cuidados primários, com particular atenção nas consultas de Planeamento Familiar e Pré-natal, e a capacitação dos profissionais de saúde para reconhecer e tratar a hipertensão em mulheres jovens.
Além disso, destacam a importância de integrar a prevenção das doenças não transmissíveis nos programas de saúde materna e infantil, bem como intensificar campanhas de sensibilização dirigidas à população, promovendo a medição regular da pressão arterial. Anteriormente, estudos em Moçambique indicavam que cerca de 30% dos adultos poderiam ser hipertensos, com uma tendência crescente, especialmente em áreas urbanas.
Na fase da gravidez, a hipertensão pode levar a complicações graves como a pré-eclâmpsia, representando riscos significativos tanto para a mãe como para o bebé.