Politica Governo violou Constituição na nomeação de PCAs da TVM e RM

Governo violou Constituição na nomeação de PCAs da TVM e RM

O Governo, cujo chefe, Armando Guebuza, jurou respeitá-la e fazê-la cumprir durante o acto da sua investidura, atropelou, afinal, a Constituição da República (CR) na anunciada exoneração e nomeação, a 17 de Dezembro último, dos Presidentes dos Conselhos de Administração (PCAS) das formalmente públicas Televisão de Moçambique (TVM) e Rádio Moçambique (RM), uma vez não ter obedecido o que a lei fundamental preconiza como mandatário nesse tipo de expediente.

É que, nos termos da norma contida no número 3 do artigo 50 da CR, o Conselho Superior de Comunicação Social (CSCS) deve ser envolvido tanto na exoneração como na indicação dos gestores de topo dos órgãos de comunicação social do chamado sector público, sem o envolvimento do CSCS está-se em face de uma nítida violação ao estatuto jurídico do Estado moçambicano.

O presidente do CSCS, o Catedrático Armindo Ngunga, confirmou ontem em declarações a esta publicação este mais recente atropelo à CR, com o que a validade do próprio acto é juridicamente duvidosa. A uma pergunta sobre se o órgão por si dirigido tinha sido envolvido, nos termos em que estabelece a lei suprema, Ngunga foi claro e directo: “O CSCS não foi consultado”.

O objecto do controvertido acto governamental foi a exoneração de Armindo Chavana Jr. e Ricardo Malate, dos cargos de PCA, respectivamente, da TVM e RM, e nomeação para a gestão máxima dos mesmos órgãos de informação nominalmente públicos, dos jornalistas Jaime Cuambe [para a TVM] e Faruco Sadique [RM]. Curiosamente, tanto Cuambe e Sadique eram, até à data da sua nomeação, membros do CSCS, órgão “fintado” pelo Governo que neles depositou confiança.

O artigo 2 da CR, sob a epígrafe “soberania e legalidade”, refere, no seu número 3, que o Estado subordina-se à Constituição e funda-se na legalidade. Em Moçambique, o Presidente da República, que é o chefe do Governo (número 3 do artigo 146 da CR), jura, no acto da sua investidura, “…respeitar e fazer respeitar a Constituição, desempenhar com fidelidade o cargo de Presidente da República de Moçambique, dedicar todas as minhas energias à defesa, promoção e consolidação da unidade nacional, dos direitos humanos, da democracia e ao bem-estar do povo moçambicano e fazer justiça a todos os cidadãos”, conforme dispõe o número 2 do artigo 150 da CR.

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Nos termos do número 1 do artigo 60 da Lei número 14/2011 (Lei do Procedimento Administrativo), o Sindicato Nacional de Jornalistas (SNJ) e o capítulo moçambicano do Instituto de Comunicação Social da África Austral (MISA-Moçambique) podem, por exemplo, querendo, solicitar que quem de direito se conforme com o quadro jurídico-constitucional: “Tem legitimidade para iniciar o procedimento administrativo e para intervir nele os titulares de direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos lesados pela actuação administrativa [nomeação, neste caso], bem como as associações [SNJ e MISA-Moçambique, por exemplo] e as fundações que tenham por fim a defesa desses interesses, no âmbito das decisões que no processo forem ou possam ser tomadas”.

E, ainda nos termos da Lei do Procedimento Administrativo, pode aqui ser convocado o seu artigo 134, sobre impulso procedimental, que reza que “os actos administrativos podem ser revogados por iniciativa dos órgãos competentes, ou a pedido dos interessados, mediante reclamação ou recurso administrativo”.

Ao que tudo indica, está-se, aqui, em presença de um vício que, mesmo sendo grave, é sanável, pelo que, em prol da defesa do Estado de Direito Democrático, em termos gerais, e do sacrossanto princípio da legalidade, especialmente, quem de direito deveria cuidar de corrigir a falha, sob pena de o Governo moçambicano se destacar naquilo que ele deveria ser exemplar.

Não deixa de ser, no mínimo, interessante o facto de o Governo não considerar o constitucional envolvimento do CSCS na exoneração e indicação de PCAs da TVM e RM, quando este [o CSCS] tem se destacado como uma espécie de “polícia parcial” da liberdade de Imprensa e de expressão, tendo como alvos de eleição os órgãos de comunicação social sem vinculação ao Estado, Governo e partido Frelimo. Formalmente, espera-se que o CSCS actue como “órgão de disciplina e de consulta, que assegura a independência dos meios de comunicação social, no exercício dos direitos à informação, à liberdade de Imprensa, bem como dos direitos de antena e de resposta”.