A população das zonas abrangidas pelo projecto de exploração de minerais pesados, no posto administrativo de Lard, distrito de Moma, província de Nampula, tem vindo a paralisar os trabalhos de perfuração da empresa Kenmare Moma Mining, Lda., como forma de pressionar a companhia a dar emprego aos locais que se sentem excluídos. Há três semanas, os populares inviabilizaram os trabalhos da Kenmare.
Segundo os populares, aquando da fase da pesquisa a Kenmare prometeu emprego às comunidades locais, quando a exploração começar, o que não está a acontecer.
Ismael Hassane, 28 anos de idade, é pai de oito filhos. Vive no povoado de Nakata. Disse que a Kenmare prometeu, aquando do início da fase de produção, que ia recrutar jovens daquele povoado para emprego.
Gabriel Terente, secretário do bairro Nakata, disse que a actividade predominante da zona é agricultura. Desde que a companhia começou a explorar, alguns jovens foram recrutados para trabalhar na mina, o que é muito pouco para um povoado com 2.250 habitantes.
“Dizem que sou velho. Não posso ir trabalhar na mina. Os nossos filhos são jovens e estão aqui sem nada fazer. Já vieram recrutar 8 jovens que eram pescadores e já estão a trabalhar. Reconhecemos que a Kenmare abriu uma escola e dois furos de água. Isso é bem-vindo para a comunidade, mas queremos mais”, disse Terente.
Alberto Gomes foi reassentado em 2007 do povoado de Namalopi para o bairro de Mutiticoma. Foi trabalhador da Kenmare e foi expulso em Abril do ano passado, acusado de falsificar certidão de óbito do seu filho para se beneficiar do subsídio que a empresa dá aos trabalhadores quando perdem seus parentes.
“A empresa mandou-me embora sem justa causa. Ora dizem que falsifiquei a certidão, ora não tenho idade para trabalhar. Antes dedicávamos à pesca e agricultura. Agora as nossas machambas são minas”, disse.
A população inviabiliza perfuração de máquinas
O director dos Recursos Humanos da Kenmare, Caetano Amurane, disse que há três semanas a população inviabilizou o trabalho que as máquinas estavam a fazer numa zona por onde vai passar a mina. No ano passado, disse que também houve paralisação de trabalho.
“Há três semanas houve paralisação. No ano passado também registámos algumas paralisações. A população foi amotinar-se e ordenou para que a máquina não trabalhasse. Como não podemos entrar em confronto com a população, envolvemos os secretários de bairro, chefes de localidade e de posto administrativo até se resolver o problema. Só a partir daí é que retomamos”, disse Amurane.
27 mil pessoas disputam 1.710 postos de trabalho
Caetano Amurane disse, por exemplo, que este ano 27 mil pessoas vão disputar 1.710 vagas em diversas áreas na Kenmare. Disse que quando as comunidades não arranjam emprego ficam chateadas e vão paralisar os trabalhos até se chamar estruturas locais para explicar o que está a acontecer.
“O nosso desafio é destas listas longas de 27 mil pessoas à procura de emprego. Nós não temos vagas para estes números. As listas estão connosco e não podemos acomodar toda a gente. O que nós fazemos é seguir as listas e isso pode levar seis meses ou um ano. É este o desafio que temos com as comunidades. Eles dizem que não damos emprego. Os secretários de bairro trazem listas de todos residentes do bairro apesar de alguns não serem naturais. A nossa ideia não é discriminar os moçambicanos. Não queremos entrar em colisão com a lei”, disse.
Segundo a nossa fonte, estes números crescem. Por exemplo, disse que em Dezembro de 2012 tinham 656 moçambicanos, mas em Dezembro de 2013 o número cresceu para 1354 permanentes. Até finais de Janeiro de 2014 estava-se nos 1387. Destes 1078 foram recrutados localmente.
Não há discriminação
O director dos Recursos Humanos da Kenmare disse que não há discriminação de moçambicanos no processo de recrutamento.
“Nós não podemos discriminar outros moçambicanos que não nasceram aqui. Trabalhamos com listas enviadas pelos secretários. Aqui há critério de selecção porque há especialidades. Nas posições que achamos que podemos ter aqui, recrutamos”, disse.
Explicou que sendo a 7ª classe a última classe leccionada naquele local, significa que as pessoas não estão habilitadas para conseguirem emprego em determinadas posições.
“O emprego directo é para todos que estão aqui na comunidade, mas há pessoas que vêm de diversas partes do país e dizem que vivem em Topuito e fazem parte da comunidade. Temos uma lista que cada secretário de bairro elabora e trabalhamos na base dessas listas. Temos 1630 pessoas recrutadas incluindo 82 temporais com contratos de 6 meses a um ano. Destes 1078 foram recrutados localmente. Mas há pessoas que vêm de Moma, Angoche, Meconta, Mogovolas e outras partes do país”, disse.
Mas existem aqueles que foram recrutados em Nampula em número 105. Na cidade de Maputo, foram recrutados 252 especialistas. Também foram recrutados cerca de 170 estrangeiros de países como Austrália, Irlanda, Canada, África do Sul, Zimbabwe, Namíbia, Nepal, Nova Zelândia, Serra Leoa, Portugal, Reino Unido, Índia, entre outros.
“Kenmare deve fazer mais”
“No que diz respeito ao emprego, a Kenmare precisa fazer mais porque a população está ali a ver pessoas a entrar na empresa. Mas, para isso alguma coisa falta. Tratando-se do pessoal qualificado, em vez de fazer apenas recrutamento externo, poderia se pegar no pessoal que está aí com 10ª ou 12ª classes, fazer uma formação e aí já teríamos um pessoal qualificado, mesmo que seja de nível médio e teríamos resolvido em 75 por cento”, disse o secretário permanente de Moma, Chaemad Alide.
Segundo Alide, esta é a parte da preocupação das populações de Topuito e arredores. “As populações manifestam-se por causa de emprego. As populações gostariam que toda a gente trabalhasse na Kenmare, o que não é possível. Nesta parte na empresa há muito trabalho.
Alide disse ainda que como Governo já se reuniu com a empresa para resolver as preocupações das populações que às vezes começa-se por um simples pretexto e chega-se à conclusão de que é mesmo problema de emprego.
“Estamos a fazer ver a empresa que é preciso mudar a maneira de como faz o recrutamento, apesar de esta assim ter concebido”, disse.
“Não temos emprego para satisfazer a todos”
O director-geral da Kenmare em Moçambique, Gareth Clifton, reconhece a preocupação das comunidades, mas afirma que não há emprego para satisfazer a todos.
“Realmente o desafio maior em termos de satisfação é conseguir dar emprego, mas não é possível empregar toda a gente. Quando iniciámos, tínhamos a ideia de termos 700 postos de emprego permanente na vida da mina, mas hoje em dia temos 1500, onde mais de mil são das comunidades circunvizinhas da mina. Já ultrapassamos a meta inicial neste projecto. A preocupação é certa, mas não temos emprego suficiente para satisfazer a todos”, disse.
Projectos sociais aliviam
A Kenmare Moma Mining vai investir, nos próximos 24 meses em projectos sociais, 2.6 milhões de dólares americanos nas comunidades do posto administrativo de Lard, em Moma.
Estes projectos estão inseridos nas áreas de saúde, educação, geração de rendimentos, agro-pecuária e desporto nas comunidades reassentadas na sequência do projecto de extracção das areias pesadas de Moma, segundo explicou a coordenadora da Associação do Desenvolvimento da Kenmare, Hlaleleni Matolo.
Matolo disse, por exemplo, que no sector de geração de rendimentos já estão em curso 25 projectos com 150 beneficiários de onde 30 por cento são mulheres. Indicou ainda que quatro projectos foram estabelecidos com fornecedores de ovos à Kenmare com receitas de 16.347 dólares, costura de sacos também fornecidos à empresa com receitas de 73.200 dólares e produtores de hortícolas com receitas de 22.547 dólares.
A coordenadora do projecto de responsabilidade social disse que a Kenmare tem duas abordagens nas comunidades. Primeiro, identifica oportunidades. Segundo, identifica o negócio a ser desenvolvido.
“Não cobramos taxa de juros. Os beneficiários devolvem os valores de acordo com os termos de contratos. Existem beneficiários que têm barracas, bancas de reparação e venda de peças de motas, bicicletas, salinas, criação de frangos, produção ovos, criação de gado bovino e caprino, entre outros”, disse.