Um novo estudo do Instituto de Estudos de Segurança (ISS Africa) e do Instituto de Formação Judiciária de Moçambique alerta que a insurgência armada no Norte do país é “uma das ameaças menos compreendidas e mais nebulosas de África”.
“Pouco se sabe sobre a identidade, objectivos e a ideologia do grupo” que há cinco anos ataca o Norte do país, cujos militantes “não têm uma estratégia de comunicação clara” e isso “torna a resolução da crise ainda mais difícil”, refere o estudo. As dúvidas sobre o que está por detrás da violência levou os autores a procurar perceber junto da população “as causas profundas da crise” – actuar na raiz, pode ser uma solução, justificam.
Assim, dirigiram um inquérito que abrangeu 309 pessoas e 28 “informadores bem colocados”, aos quais foi apresentado um leque de respostas pré-definido para cada resposta. Tal como sugerido noutros trabalhos, a descoberta de recursos naturais valiosos surge como a resposta mais escolhida acerca das causas do conflito.
“Um total de 45 por cento dos entrevistados disse que a principal causa da insurgência foi a descoberta de rubis e gás natural”, outros apontaram a disponibilidade de armas ilícitas (13%), marginalização económica (6%), ganância da elite (5%) e má governação (4%).
Segundo a opinião do ISS, as respostas sustentam a ideia de que o grupo militante Ahlu-Sunnah wal Jama’a (ASWJ), apoiado pelo Estado Islâmico em Moçambique, “foram facilitados pela chamada maldição dos recursos naturais: elevaram-se as expectativas da população, mas aumentaram as desigualdades”.
“Alguns queixam-se de terem perdido terras e meios de subsistência para as infra-estruturas de gás construídas em terra”, duvidando que os projectos “reduzam a pobreza e melhorem os Serviços Públicos”.
Assim, “o que inicialmente era um pequeno grupo radical cresceu para se tornar uma grande ameaça que afastou grandes multinacionais como a TotalEnergies”, descreve o sumário.
“Uma proporção muito maior (38 por cento) mencionou fontes estrangeiras e 13% disse que o grupo utiliza recursos próprios”, resultado de pilhagens.
A etnia foi vista por apenas 2% dos entrevistados como motor da insurgência.
O papel de uma ideologia extremista e o recrutamento e radicalização da ASWJ “não devem ser negligenciados”, alerta o estudo.
Cerca de 60 por cento dos inquiridos disseram que “a religião desempenha algum papel na violência, embora muitos acreditem que a religião muçulmana esteja a ser instrumentalizada”.
“O estudo constatou que a radicalização ocorre predominantemente nas mesquitas e, em menor grau, nos mercados”, contrariamente à tendência global de radicalização “cada vez mais feita online e por meio de outras redes ilícitas”.
O estudo conclui que “há necessidade de diálogo e reconciliação entre muçulmanos e cristãos em Cabo Delgado”, mas “também entre muçulmanos”, e acções governamentais necessárias “incluem a parceria com organizações locais para tratar de queixas legítimas”. O ISS África sugere ainda a criação de “uma Co-missão de Inquérito sobre os impulsionadores do extremismo violento e o desenvolvimento de uma estratégia nacional para lidar com todos os aspectos da crise”.