A junta militar que afastou do poder o presidente Mohamed Bazoum começou o dia a dar sinais de que se preparava para a guerra e terminou com a indicação de querer dialogar com a Comunidade Económica de Estados da África Ocidental (CEDEAO), depois de uma delegação da organização ter sido ignorada, bem como o seu ultimato para voltar à ordem constitucional ou enfrentar uma intervenção militar.
A esta aparente inflexão juntou-se a voz dos Estados Unidos, ao falar de uma “janela de oportunidade” para o golpe ser revertido.
O risco de uma nova guerra eclodir não está afastado. Depois da recusa da junta militar em ceder ao ultimato da CEDEAO e devolver o presidente eleito ao poder, tropas oriundas de fora da capital chegaram no domingo à noite a Niamey para reforçar a segurança.
Mais tarde, o espaço aéreo foi encerrado, segundo a junta, devido à ameaça de uma intervenção militar estrangeira. “Forças de uma potência estrangeira mostram-se dispostas a agredir Níger e o seu povo”.
Perante esse cenário, os países vizinhos apanhados na febre dos golpes militares – Mali e Burquina Faso, suspensos da CEDEAO a par da Guiné Conacri – não só mostraram solidariedade para com a junta liderada pelo general Tchiani mas também afirmaram que uma intervenção no Níger seria uma “declaração de guerra” ao seus países.
O ministro dos Negócios Estrangeiros maliano deu como exemplo o Iraque e a Líbia, invadidos em nome da democracia. “Vemos os resultados da força militar usada noutros países. É um desastre”, disse Abdoulaye Diop ao lado da homóloga do Burquina, Olivia Rouamba.
A CEDEAO tem um historial de intervenções nas últimas décadas, quer para assegurar a paz na Serra Leoa e na Libéria ou para restaurar a ordem democrática, como aconteceu na Gâmbia, em 2017. Até agora três países mostraram-se dispostos a intervir militarmente: a Nigéria, cujo chefe de Estado Bola Tinubu é o novo presidente da CEDEAO, o Senegal e a Costa do Marfim. Fora da comunidade, o Chade poderá permitir a passagem de tropas, e a França – que tem uma base aérea no país – também dará apoio político e possivelmente de informações.
Na CEDEAO, quem tem mostrado ser o maior adepto do uso da força é o líder nigeriano. “Tinubu é alérgico a golpistas. Esteve preso durante uma ditadura militar. Não gosta deles. E precisa de afirmar a sua autoridade em toda a região”, disse o investigador Alex Vines, do grupo de reflexão Chatham House, à TRT World.
Entretanto, a CEDEAO tem dito e repetido que a intervenção armada seria o último recurso. E nas últimas horas sucederam-se sinais de que o tempo ainda pode ser de diálogo. Na quinta-feira, o bloco político vai reunir-se em Abuja, onde o líder do Senado Godswill Akpabio rejeitou dar luz verde a uma guerra no vizinho do norte. O presidente argelino Abdelmadjid Tebboune afirmou que “ameaçar com uma intervenção militar no Níger é uma ameaça direta à Argélia”.
Os chefes da diplomacia da Alemanha e da Itália apelaram na segunda-feira para que o prazo dado pela CEDEAO aos golpistas seja prorrogado. “A única via é a diplomática. Deve ser encontrada uma solução. Não está determinado que não haja outra solução além da guerra”, disse o ministro italiano Antonio Tajani. “Apoiamos a CEDEAO nos seus esforços de mediação, que ainda estão a decorrer”, disse um porta-voz da ministra alemã Annalena Baerbock, que lembrou que o facto de o prazo ter expirado não significa uma ação militar automática. “Esperamos que estes esforços acabem por conduzir a um êxito e que a ordem constitucional seja restaurada no Níger”, concluiu.
No entanto, no final do dia, dois sinais importantes: os EUA, aliado militar do Níger, e que tem feito esforços de mediação discretos, pronunciou-se sobre o assunto ao afirmar que “a janela de oportunidade ainda está definitivamente aberta”.
O porta-voz do Departamento de Estado, Matthew Miller, disse ainda que “a junta deve afastar-se e deixar o presidente Bazoum retomar as suas funções”.
E o primeiro-ministro nigerino, Ouhoumoudou Mahamadou, disse ao canal francês TV5 Monde que a delegação da CEDEAO deve regressar para conversações, depois de uma primeira tentativa que redundou em falhanço.