O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu nesta sexta-feira, 30 de junho, declarar Jair Bolsonaro inelegível até 2030 por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação por atacar, sem provas, o sistema de voto eletrónico usado no Brasil, numa reunião com embaixadores convocada para o efeito no Palácio da Alvorada, em julho de 2022.
Carmen Lúcia e Alexandre de Moraes, membros daquele colegiado e juízes do Supremo Tribunal Federal (STF), juntaram-se a outros três magistrados que haviam votado anteriormente e formaram uma maioria de cinco votos em sete possíveis pela condenação do ex-presidente do Brasil. Nunes Marques, que também acumula cargos no TSE e no STF, divergiu, assim como um colega.
“Toda a produção daquele evento no Alvorada foi feita para que a TV Brasil divulgasse e a máquina de desinformação das redes sociais multiplicasse de forma a chegar ao eleitorado”, disse Alexandre de Moraes.
Braga Netto, candidato a vice-presidente de Bolsonaro em 2022, também estava em julgamento mas foi absolvido, por sete votos a zero.
Bolsonaro deve agora recorrer ao próprio TSE e ao STF e tentar votar uma amnistia no Congresso Nacional. Ele reagiu de imediato ao resultado: “tentaram matar-me em Juiz de Fora há pouco tempo com uma facada na barriga, hoje levei uma facada nas costas com a inelegibilidade por abuso de poder político”.
Por sua vez, o Partido dos Trabalhadores, de Lula da Silva, escreveu nas redes sociais que foi “um grande dia”. “Por maioria no TSE, Bolsonaro acaba de se tornar inelegível por oito anos por todos os ataques à democracia e pelos crimes que cometeu contra o nosso país”.
No entanto, o ex-candidato presidencial Ciro Gomes, do PDT, partido que moveu a ação, disse que o partido “queria proteger a democracia e punir o abuso de poder político praticado por Bolsonaro. Bolsonaro inelegível por império da lei”.
Como a condenação já era um cenário provável, Bolsonaro e o seu partido, o PL, planeiam as próximas eleições municipais, em 2024, sob o mote de suposta “perseguição política”. “A ideia é que, com esse cenário, sejam transferidos ainda mais votos para quem Bolsonaro apoiar na eleição municipal do ano que vem, a intenção do PL é aumentar o número de cidades geridas pelo partido de 300 para mil”, escreveu a colunista Bela Megale, de O Globo, ainda antes do julgamento
E o partido prepara também as presidenciais de 2026 sem o inelegível Bolsonaro e, talvez, sem Lula, que em campanha prometeu não concorrer à reeleição mas dá agora sinais de que não vai cumprir a promessa.
Por isso, o caminho da sucessão já começou a ser trilhado pelo PL, cujos spots publicitários das últimas semanas nas televisões brasileiras tornaram Michelle Bolsonaro, a ex-primeira-dama e atual presidente do PL Mulher, uma protagonista. Apesar de envolvida no caso das joias sauditas desviadas pelo marido do acervo presidencial para a própria casa, Michelle continua a ser aposta pessoal de Valdemar Costa Neto, o presidente do PL, que a vê com potencial eleitoral, ainda para mais apoiada pelo marido.
“Se Bolsonaro não for candidato, nós temos a Michelle, no lançamento [da candidatura de 2022] do Bolsonaro no Maracanãzinho, ela revelou-se, por isso, se ele for candidato, será um fortíssimo candidato, se ele não for candidato, será mais forte ainda, porque esse movimento de direita veio para ficar”, disse Costa Neto ainda antes do caso das joias.
Outros nomes, no entanto, se perfilam para empunhar a bandeira do “bolsonarismo sem Jair”. Desde logo, o do candidato derrotado a vice-presidente Braga Netto, general que assumiu o cargo de secretário de Relações Institucionais do PL, erigiu o observatório político do partido, centro de elaboração de propostas de oposição ao governo Lula, já viaja pelo país a acompanhar Michelle e saiu incólume do julgamento. Visto como quadro relevante, Braga Netto pode concorrer à prefeitura do Rio de Janeiro no próximo ano para ganhar corpo para o pleito presidencial de 2026.
Já no palco político, os governadores Tarcísio Freitas e Romeu Zema, do Republicanos e do Novo, partidos na órbita do PL, também são naturais “candidatos a candidatos”. O primeiro conquistou o governo de São Paulo, o mais populoso e rico do país, batendo Fernando Haddad, hoje ministro das Finanças de Lula, e, com perfil técnico e realizador, é visto como principal expoente da face mais palatável do bolsonarismo.
Mas tem contra si o facto de estar em primeiro mandato, sob pressão de tentar a reeleição, ao contrário de Zema, a cumprir o segundo, e, por isso, livre para assumir o desafio nacional em 2026.