Sociedade Boustani admite corrupção com antigos governantes

Boustani admite corrupção com antigos governantes

O advogado de Jean Boustani, acusado no escândalo das dívidas ocultas de Moçambique, admitiu que o arguido está “profundamente envolvido” em corrupção com governantes moçambicanos, mas argumentou que não quis defraudar os investidores norte-americanos.

“A única questão que os jurados terão de decidir é se Jean Boustani é culpado dos crimes específicos de que está acusado”, disse Michael Schachter na intervenção inicial, na qual admitiu que o arguido está “profundamente envolvido” no esquema de corrupção conhecido como o escândalo das dívidas ocultas em Moçambique.

A argumentação da defesa passa por vincar que apesar de ter corrompido os governantes moçambicanos, Boustani não quis defraudar os investidores que ‘compraram’ os empréstimos dos bancos Credit Suisse e VTB às empresas públicas moçambicanas.

“Os Estados Unidos nunca estiveram na mente de Boustani, um cidadão libanês que estava a fazer negócios em Moçambique”, vincou Michael Schachter, durante a intervenção no julgamento que decorre em Brooklyn, Nova Iorque.

“A investigação do Governo norte-americano está mal direcionada, não há qualquer prova de que Boustani esteve envolvido numa fraude aos investidores nos empréstimos, nem há prova de que tenha tentado ‘lavar’ o dinheiro que recebeu”, argumentou o advogado.

Abordando directamente a questão da corrupção em África, Schachter disse que o fenómeno acontece de forma “mais directa” que nos Estados Unidos e que fazer grandes pagamentos a governantes pode ser simplesmente o custo de fazer negócios na região.

“Podem não gostar disso, mas o que têm de decidir é se o arguido é acusado dos crimes específicos de que é acusado”, afirmou aos jurados, tentando recentrar o julgamento na perda para os investidores norte-americanos e não na questão da corrupção a antigos governantes moçambicanos.

Boustani é acusado de conspirar com antigos banqueiros do Credit Suisse e com ex-governantes moçambicanos, e outros envolvidos, num esquema de 2,2 mil milhões de dólares, no âmbito do qual desviou 200 milhões de dólares para si próprio e para outros, segundo a Acusação dos Estados Unidos.

O empresário libanês nem sequer tentou esconder o dinheiro, que foi depositado numa conta em seu nome nos Emiratos Árabes Unidos, argumentou o advogado.

Na mesma sessão do julgamento, a advogada da acusação Margaret Moser disse que os argumentos do seu colega da defesa não são válidos porque Boustani, “em vez de obter os empréstimos honestamente, conseguiu-os com base numa fraude”.

Os investidores foram enganados porque pensavam que o dinheiro só ia ser usado para o projeto de monitorização marítima e que não havia subornos envolvidos.

“[Os argumentos de Boustani] são uma mentira e o arguido sabia-o porque já tinha concordado em pagar subornos aos seus parceiros criminosos”, argumentou.

As declarações em julgamento são o mais recente capítulo do processo das dívidas ocultas de três empresas públicas moçambicanas, que já levou à detenção do antigo ministro das Finanças Manuel Chang e de um dos filhos do antigo Presidente Armando Guebuza, para além de três banqueiros do Credit Suisse e vários responsáveis governamentais moçambicanos.

Na investigação, a Justiça norte-americana acusa membros do anterior Governo de Moçambique, a Privinvest e três ex-banqueiros do Credit Suisse de terem criado um falso projecto de defesa marítima para receberem mais de 200 milhões de dólares em subornos para si próprios em acordos assinados em 2013 e 2014, apontando Jean Boustani como o principal operacional do esquema de corrupção no valor de 2,2 mil milhões de dólares.

A descoberta de empréstimos contraídos com aval do Estado mas sem registo nas contas públicas e sem divulgação aos parceiros internacionais levou os doadores a cortarem a assistência internacional e as agências de rating a descerem a opinião sobre o crédito soberano.

Em consequência, aumentou o rácio da dívida pública sobre o PIB, o que arredou o país do financiamento internacional, atirando Moçambique para ‘default’ e para uma crise económica e financeira que ainda persiste.

Lusa